terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Capoeira Patrimônio Imaterial da Humanidade


Não faz parte da proposta do blog reproduzir textos já divulgados por outros meios; entretanto, dada a importância do tema e a afinidade com as questões que aqui discutimos, postamos o texto de divulgação do manifesto pela inclusão da capoeira na Lista do Patrimônio Imaterial da Humanidade, mantida pela Unesco.

Vamos examinar o tema nas próximas postagens. No momento, pedimos a atenção para o texto divulgado pelo Iphan.

Mestre Luiz Renato




O nosso mundo da Capoeira vai firmar ainda mais a nossa Capoeira no mundo

A Unesco, organização internacional de educação e a cultura, vai se reunir em 2014 para incluir a Capoeira na lista do Patrimônio Imaterial da Humanidade. O Brasil já tem 18 bens declarados nessa lista do Patrimônio Mundial. Chegou a vez da Capoeira. É mais um passo na consolidação da Capoeira como expressão original do povo brasileiro que se oferece aos povos do mundo como prática, atitude de vida, pensamento, técnica, esporte, prazer, arte e cultura.

Não é só mais um título bonito para colocar na parede nem é mais um simples reconhecimento para compor discursos de exaltação. Vai além. É um pacto entre o Brasil (governo e sociedade) e o mundo para aumentar as bases de expansão das nossas raízes. Um passaporte a mais para abrir fronteiras e dar o tom brasileiro, detentor absoluto das raízes dessa prática, no cenário internacional. O título é um ato de fortalecimento que não interfere na autoria da Capoeira nem na autoridade dos Mestres. A Capoeira continua fiel a sabedoria dos que a criaram sem perder direitos nem sofrer intervenção em seu conceito. O que se abre é a possibilidade de criação de mais estrutura e força política. Obriga governos e instituições a um zelo mais profundo no incentivo e manutenção das políticas públicas com investimentos continuados e programas definidos a partir do diálogo.

O mundo da Capoeira sabe o valor histórico da luta e o quanto se avançou até aqui. Sabe o tamanho do desafio para prosseguir e o tanto que se exige para uma paixão sair da semente até virar tronco forte na vida. O título da Unesco será mais uma conquista nesse caminho. A Capoeira precisa do comprometimento de muitas parcerias e pontes para ter a chance de se mostrar autêntica e única. Sem perder o tom da raiz brasileira nem entregar suas raízes para oportunistas. Ninguém “vira patrimônio da humanidade”, do nada. É um processo longo em que o mundo reconhece a realidade que já existe e vai ajudar na estratégia de continuidade mais forte dessa prática, saber, paisagem, pensamento ou celebração.

A Unesco é mais uma aliada nessa luta. Esta organização internacional foi criada para oferecer condições de diálogo entre culturas, nações e povos com respeito aos direitos humanos, às diferenças culturais comprometidas em trabalhos pela paz e diminuição das desigualdades econômicas entre as nações. Por isso a Unesco desenvolve políticas e projetos em vários países, através de acordos de cooperação técnica e convênios com governos e sociedade na salvaguarda do patrimônio cultural e natural de todo o mundo.

Nas políticas culturais da Unesco e do Brasil a categoria “patrimônio cultural” se subdivide em “patrimônio cultural material” e “patrimônio cultural imaterial” – ou intangível. Na legislação federal brasileira o “patrimônio cultural imaterial” envolve as expressões culturais de importância e referência enquanto saberes, formas de expressão, celebrações e lugares significativos da diversidade e riqueza cultural do país. Nos termos da Unesco, o “patrimônio cultural intangível” envolve as “tradições orais”, “culturas e artes populares”, “línguas indígenas”e “ manifestações tradicionais” legados de saberes que expressam a riqueza da criatividade e experiência humana em vários tempos e lugares.

Em 2003, a partir da aprovação da Convenção Para a Salvaguarda do Patrimônio Imaterial, a Unesco criou a Lista Representativa do Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, a Lista dos Bens Culturais em Necessidade de Salvaguarda Urgente e a Lista de Programas, Projetos e Atividades de Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial. Em 2008 as Expressões Orais e Gráficas dos Povos Wajãpi, no Amapá, e o Samba de Roda do Recôncavo Baiano foram inscritos na Lista Representativa do Patrimônio Oral e Imaterial da Humanidade.



A Lista os Bens Culturais em Necessidade de Salvaguarda Urgente destina-se aos bens cuja sua viabilidade corre perigo apesar dos esforços dos grupos ou comunidades que os praticam. Com a inscrição nesta Lista, o Estado envolvido deve implantar planos de salvaguarda específicos que poderão beneficiar-se de assistência financeira procedente do Fundo do Patrimônio Cultural Imaterial, criado com esse objetivo.

São positivos os resultados desses processos para os grupos que constituem a base social das expressões culturais reconhecidas. Crescem além da visibilidade, criam maior respeitabilidade no trato com o Estado, ampliam possibilidades de fomento a projetos e ações para disponibilizar e adequar espaços físicos para centros de referência, aquisição de acervos, equipamentos e matérias primas, oficinas de transmissão de saberes, treinamentos em pesquisa e gestão de políticas de salvaguarda, ações educativas e edições diversas, até encontros, seminários e outras ações.




Estas ações têm sido estruturadas e desenvolvidas no conjunto dos “planos de salvaguarda” destes bens culturais, os quais são elaborados e implementados a partir de “Conselhos Gestores” compostos por representantes dos grupos sociais detentores da expressão cultural e de instituições parceiras, de modo inclusivo e participativo.




A capoeira já tem régua e compasso para traçar seu caminho no mundo. Já tem seu reconhecimento consagrado em inúmeros países e cresce na dedicação daqueles praticantes sempre fiéis a sabedoria dos seus Mestres. Mas há sempre o que se firmar mais. Esta construção coletiva se faz mais complexa atualmente. A exigência de organização da base social precisa contar mais e mais com ferramentas, estratégias e políticas para estabelecer os termos da difusão da prática sem perda da essência que é a própria seiva que legitima tudo. O nosso mundo da Capoeira não perde seu chão quando fica mais forte esse jogar da Capoeira no mundo.

O título fortalece o argumento dos que desejam avançar a Capoeira no mundo, pois o mundo se abre melhor para receber, entender, pesquisar, jogar e trocar com mais esta riqueza da diversidade cultural brasileira. Não se perdem direitos de uso nem se concede práticas sem direitos: é um título que legitima quem faz, dentro e fora do país, e funciona para melhor abrir as fronteiras. Um mundo que reconhece o valor da nossa casa é um mundo que nos convida a entrar pela porta da frente.

A lista a ser enviada a Unesco é de responsabilidade do Iphan e tem como base um dossiê de candidatura redigido a partir de pesquisas já realizadas e a indicação de ações para salvaguarda e incentivo da Capoeira. O Grupo de Trabalho Pró-Capoeira coloca na roda do encaminhamento deste dossiê encaminhado à Unesco. Todas as demandas e propostas levantadas nos Encontros Pró-Capoeira foram consideradas na elaboração do dossiê. Após a finalização da candidatura uma comissão intergovernamental decidirá sobre a pertinência da inscrição.

É com essa intenção que o Iphan encaminha aos capoeiras do Brasil esta Lista de Adesão sobre as candidaturas da Roda de Capoeira e do Ofício de Mestre de Capoeira respectivamente, às Listas Representativa e dos Bens Culturais em Necessidade de Salvaguarda Urgente da Convenção da Unesco para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil.